domingo, novembro 25, 2007

Tropeçar na criação de valor

Hoje resolvi abordar mais uma vez o tema da produtividade, por causa duns postais que li, do economista Pedro Arroja, no blog Portugal Contemporâneo.

Neste postal pode ler-se:

“… pressões para que a produtividade no país seja melhorada - e se produza mais pelo mesmo custo, ou se produza o mesmo a mais baixo custo.”

Esta é a visão típica de quem só olha para os números, de quem segue uma abordagem protestante da vida (ver este outro postal de Pedro Arroja). Quem só conhece rácios financeiros só consegue olhar para a equação da produtividade e ver duas alternativas: produzir mais peças pelo mesmo custo, ou produzir as mesmas peças a um custo mais baixo.

Quem conhece o mercado dos seus produtos e serviços, quem conhece os clientes dos seus produtos e serviços, e tem um caso amoroso com esses seus produtos e serviços, pode vir a descobrir que existe uma outra alternativa, espectacular, porque muito mais poderosa que as outras duas, para aumentar a produtividade, para dar saltos de produtividade. Para isso há que apelar ao lado direito do cérebro, ao lado criativo, ou como diz Pedro Arroja, o lado católico. A criatividade permite partir, rebentar as grilhetas, as algemas limitativas dos custos, e descobrir um mundo novo o mundo da criação de valor, o infinito mundo da criação de valor. Nesse novo mundo, a produtividade aumenta, mesmo que aumentem os custos, desde que eu produza peças diferentes, peças com maior valor acrescentado, peças tão diferentes e atractivas, que os clientes estão dispostos a pagar mais por essa diferença e atracção. E se a minha empresa se especializar nisso, ou seja, se a minha empresa aprender a criar novidades atraentes e diferentes com alguma regularidade, vou começar a vender produtos cada vez mais caros, porque o mercado premeia a diferença, e vou poder premiar os meus colaboradores, e vou deixar de enganar os meus fornecedores, e de recorrer a expedientes típicos de quem vive tempo emprestado.

Quando não vendo produtos diferentes, é tudo igual… quando é tudo igual, o critério de compra dos clientes é o preço, o preço mais baixo.

A descoberta do mundo novo do valor não pode ser decretada por um qualquer governo, tem de ser uma descoberta pessoal de cada empresa, de cada gestor. Apesar de tudo ela vai acontecendo, basta atentar no calçado (A produtividade física - pares por número de trabalhadores -, entre 1974 e 2005, cresceu 15% e o valor bruto da produção por trabalhador aumentou 33%, apesar de não acreditar que as razões aventadas na entrevista sejam as mais importantes,). IMHO, o que era importante era que as barreiras à entrada de novos empresários fossem menores (o que implicaria, por exemplo, impostos mais baixos, para que o risco fosse menor), e as barreiras à saída fossem diminuídas, nada de subsídios ou apoios, nada de soro, quem não é capaz de seduzir o mercado tem de sair, sem apelo nem agravo… é a vida. Para que a evolução funcionasse rapidamente e premiasse quem tropeçasse (literalmente) na opção de aposta na criação de valor, até que o truque se contagiasse a uma massa crítica de empresas e assim, emergisse uma nova economia, uma que funcionasse com os dois lados do cérebro, o católico e o protestante.

Quem não conhece o truque da aposta no valor, tem a mente aprisionada num paradigma que só encontra solução no corte dos salários: Pedro Arroja aqui: “Então, só resta uma saída: os salários vão ter de baixar em Portugal para que a competitividade internacional do país possa aumentar. Para que os salários baixem é necessário, em primeiro lugar, que se gere uma situação de excesso de oferta no mercado de trabalho, significando que o desemprego no país está destinado a aumentar também.”, mas também Olivier Blanchard aqui. Como refiro aqui, por que não aprender com “How we compete” de Suzanne Berger and the MIT Industrial Performance Center, publicado em Janeiro de 2006:

Na página 255:
“… there are no “sunset” industries condemned to disappear in high wage economies, although there are certainly sunset and condemned strategies, among them building a business on the advantages to be gained by cheap labor”

Na página 257:
“If they prosper despite competition from foreign companies with very low-paid workers, it is because they bundle into the products they sell other desirable features, like speed, fashion, uniqueness, and image.”

Uma das frases que descobri há quase um mês, e continua a circular na minha mente é: "It is widely believed that restructuring has boosted productivity by displacing low-skilled workers and creating jobs for the high skilled."Mas, e como isto é profundo:"In essence, creative destruction means that low productivity plants are displaced by high productivity plants." Por favor voltar a trás e reler esta última afirmação.
Não faz sentido é abrir o jornal (Vida Económica desta semana, e descobrir, pela boca do ministro Pinho, os milhões do QREN, para apoiar, para remediar empresas em estado de coma, que não descobriram ainda que precisam de mudar de paradigma, e que enquanto forem apoiadas, continuarão a negar a realidade e a acreditar que aquilo que resultou no passado, continua válido, apesar do mundo ter mudado.

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