sábado, abril 19, 2008

Leite não é o mesmo que vinho verde

A propósito do artigo do Público de hoje "Adegas cooperativas do vinho verde unem-se em projecto empresarial conjunto" assinado por José Manuel Rocha.
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Neste artigo li alguns trechos que fizeram soar algumas campaínhas, nomeadamente:
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"O modelo empresarial adoptado pelo sector leiteiro vai ter seguimento na área dos vinhos verdes."
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"Gerar economias de escala, garantir novos canais de escoamento, valorizar o produto final numa lógica de adaptação às novas tendências do mercado são alguns dos objectivos desta sociedade, que irá assumir a designação Viniverde."
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Se perguntarem a um qualquer estudioso das prateleiras da distribuição alimentar o que é que caracteriza o sector leiteiro, ele vai responder: "O leite é a commodity por excelência no sector alimentar" (Algo que aprendi no livro "Retailization - Brand Survival in the Age of Retailer Power":."Milk is the ultimate low-involvement category, and it shows. Only 10% of the international sample (in Denmark, Germany and Spain the number is less than 5%) would expect the private label version to be of a lesser quality.")
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Cuidado, aquilo que funciona para o leite, pode não funcionar para o vinho verde.
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Se o leite é a commodity alimentar por excelência, faz todo o sentido gerar economias de escala, porque o negócio é o preço-baixo.
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Estas campaínhas são de certa forma atenuadas por estes outros trechos:
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"A intenção dos promotores é a contratação de elementos para uma direcção executiva que se vai preocupar com aspectos fulcrais do negócio: a vinificação, a comercialização e o marketing de produto. "Será colocado um particular enfoque na questão enológica, de forma a que os nossos produtos tenham uma maior correspondência com aquilo que os consumidores de nós esperam", afirmou ao PÚBLICO um dos promotores."
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Os consumidores não são todos iguais, a que consumidores se dirigem? Por que é que esses consumidores-alvo vão optar pelas marcas da Viniverde?
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Trabalhando para esses clientes-alvo, conseguem montar uma máquina de ganhar dinheiro de forma sustentável?
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O que é que vão vender? Marcas de preço-baixo para a grande distribuição? Se sim, não percam muito tempo: reduzir custos (economias de escala) e seduzir os donos das prateleiras.
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O que é que vão vender? Marcas de valor acrescentado para a distribuição especializada? Se sim, não percam tempo: criar produto enológico realmente bom (não interessa o preço), marca, promoção, divulgação, concursos,...
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Os gestores e técnicos a contratar deviam sê-lo, em função do mercado-alvo escolhido. Um bom gestor para um mercado não o é tão bom para o outro mercado (a experiência gera tiques difíceis de ultrapassar)
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E para complicar, até que ponto, podem ter duas "empresas" numa? Uma estrutura produtiva e comercial para o negócio das quantidades, para o negócio do preço, e outra, para o negócio das margens, das marcas de topo? Se sim, por favor não misturem os activos, tratem-nos como duas empresas distintas, ainda que contabilistica e legalmente não o sejam.
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"Nesse sentido, a sociedade arrancará, numa primeira fase, com base nas marcas que as cooperativas asseguram actualmente, de uma forma individual. Mas uma das tarefas da direcção executiva será, precisamente, a de avaliar se há marcas que devem ser descontinuadas e se há espaço para que surjam outras com novas lógicas de consumo."
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De todas as marcas que vendem actualmente quais as que dão mais margem?
De todos os clientes que têm actualmente quais os que dão mais margem?
Porquê?
Sabendo essa informação, podem fazer batota?
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Ou seja, agora que tomaram consciência do que é que vos dá mais margem, podem concentrar todos os vossos esforços, atenções, emoções, recursos, sonhos, nisso?
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Não se preocupem com o volume: volume é vaidade, lucro é sanidade!
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Sobre vinhos e estratégia: aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

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