Mostrar mensagens com a etiqueta leite. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta leite. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, março 04, 2024

Leite, tomate e ... turismo, negócios não sustentáveis

Leite, tomate e ... turismo.

No caso do leite e do tomate percebo o que acontece e percebo o efeito pernicioso da intervenção governamental.



Dois negócios que competem pelo preço mais baixo quando não têm vantagem competitiva, ou seja, violam a primeira lei das Teoria dos Jogos: "Do not play a strictly dominated strategy"

Entretanto, no último número do Caderno de Economia do semanário Expresso apanho este título, "Aumento de custos preocupa hotelaria". 

Weird! Aumentam a facturação como nunca, aumentam os preços e as margens como nunca (e ainda bem) mas não conseguem acompanhar os custos?! 

Para mim é um sinal de que o modelo de negócio não é sustentável. Por que não encaram o problema de frente? Por que pedem aos contribuintes que financiem os seus projectos deficientemente suportados pelos seus clientes?


domingo, novembro 19, 2023

Por artes mágicas...

 Sexta-feira à noite num canal de TV durante o noticiário vi o relato deste tema aqui registado no JN de ontem

O jornal não refere algo dito na peça televisiva, vários participantes na marcha referiram ter o sector perdido centenas de explorações leiteiras nos últimos anos.

Os políticos criaram uma geração de adultos-crianças...

Factos:
  • Bebe-se menos leite: As mudanças nos padrões de consumo, como a redução do consumo de leite em certas faixas etárias ou a preferência por alternativas ao leite, influenciam a procura.
  • Bebe-se menos leite: Há cada vez menos crianças!
  • Concentração em busca de eficiência: A modernização e a busca por eficiência levam à consolidação da produção em grandes instalações, enquanto as pequenas propriedades podem não ser economicamente viáveis.
  • Regulação e exigências ambientais: Normas ambientais mais rigorosas e exigências de conformidade podem aumentar os custos de conformidade para pequenos produtores. Aqui é interessante, nunca ouvi um político português dizer aos produtores de leite, o que dizem às empresas industriais ou aos condutores de automóveis.
Por artes mágicas, terceiros têm de suportar as explorações leiteiras... por alma de quem?

Sinto tanta falta desta clareza e pragmatismo na comunicação:
"Para o BCE, a situação é mais difícil. "A zona euro encontra-se numa espiral de inflação salarial e a tendência deverá manter-se em 2024", afirma Dixmier. O problema dos aumentos salariais na Europa é que não são motivados pelo aumento de produtividade e, consequentemente, aumentam diretamente os custos das empresas. E as empresas vão querer manter as suas margens, o que irá traduzir-se diretamente em aumentos de preços. Por este motivo, o especialista prevê que o BCE terá de continuar a aumentar as taxas para combater a inflação. "A boa notícia é que vamos assistir à morte das empresas zombie dependentes de taxas de juro artificialmente baixas", acrescenta Virginie Maisonneuve, diretora de Investimento em Ações."

segunda-feira, julho 24, 2023

Diferenciação para fugir à comoditização

"The Swiss are proud of their cheese, and most of the cheese they eat are local varieties like Gruyère, Emmental and other hard cheeses from milk from happy cows that are famous all over the world.
...
In fact, the Swiss cheese trade balance has been shrinking for decades, and especially since the market was liberalized in 2007, which allowed the country to trade with the European Union without tariffs or quotas in either direction. Switzerland now exports about 40 percent of the cheese it produces, per industry estimates.
But in each of the first five months of this year, Switzerland imported more cheese by weight than it sold abroad, according to customs data
...
[Moi ici: Os números que se seguem são muito interessantes, ilustram como as marcas, como a diferenciação, permite fugir da guerra do preço. Em Maio passado estive em várias cidades suíças e é impressionante encontrar no dia-a-dia o festival de marcas suíças que trazem um valor acrescentado tremendo à simples soma dos custos] The number of dairy farmers in Switzerland has fallen in recent decades, with a drop of more than half over the past 25 years, Mr. Koller said. On top of that, farming operations in Switzerland are small: The average size of a herd is about 27 cows, Mr. Koller said, and dairy farms with more than 100 cows are rare. [Moi ici: Isto quer dizer que se o negócio fosse preço puro e duro os suíços não tinham hipótese. Até as explorações portuguesas já devem ser maiores. Recordo que sem marca, "Milk is the ultimate low-involvement category"]
...
[Moi ici: Segue-se agora um trecho difícil de encontrar em Portugal, basta recordar a malta das conservas ou do leite, "economists say there is no need to panic"] Although an influx of foreign cheese may challenge notions of Swiss national identity, economists say there is no need to panic. Swiss producers have become more specialized in recent years, and the cheeses they export tend to be the higher-value varieties, like Gruyère. Imports are cheaper and softer and largely come from France. (What's called "Swiss cheese" in the United States is an American reproduction of Swiss hard cheeses, known of course for its signature holes.)
Not all the cheese that is imported into Switzerland is consumed there, either. A large chunk of the cheese and curd brought into the country gets refined in Switzerland and then exported.
"The trade diference in cheese itself is not a major thing to worry about," said Martin Mosler, an economist at IWP, an economic policy institute at the University of Lucerne. "We are better than most of the world at the high quality stuff," he said. Switzerland continues to run a healthy trade surplus in cheese by financial value: On average, Swiss cheese exports fetch roughly 10 Swiss Francs per kilo (about $11.60), compared with about six Swiss Francs per kilo paid for imports."

domingo, outubro 30, 2022

E noção?

Ele há coisas ...

Esta semana seguia num táxi para uma empresa onde costumo ir semanalmente e o motorista, pessoa com quem já fiz várias viagens, contava-me que um edifício em ruínas que me tinha chamado a atenção era uma antiga vacaria. Depois na empresa após o almoço, durante o café, contavam-me que onde estava situada aquela empresa altamente produtiva tinha existido uma outra vacaria. Na minha mente, pensei no ganho de produtividade daqueles metros quadrados ...

Entretanto, ontem, um pouco atónito, dei de caras com este artigo, "Soberania alimentar nacional está comprometida, alertam produtores de lacticínios":

"O presidente da ANIL deixou ainda uma nota sobre a importância deste e doutros sectores para a revitalização e fixação de população no interior. [Moi ici: Ponham as coisas em perspectiva, um sector conhecido por estar sempre a chorar por falta de rentabilidade vem dizer que é um sector relevante para fixar pessoas no interior. Brincamos? E que salários é que essas pessoas vão ganhar?] “Com o devido respeito pelas novas tendências de trabalho geradas pela pandemia e potenciadas pela evolução das tecnologias de comunicação, não é com os nómadas digitais que vamos assistir à inversão dos fluxos populacionais para o litoral”, disse. 

"É sim, com a criação de condições para a sustentabilidade da produção e geração de valor em setores como este dos lacticínios", afirmou em defesa da importância da fileira láctea num pais que quer fixar populações em zonas agrárias e no interior, reduzir o fluxo migratório para o litoral, desenvolver áreas geográficas não urbanas." [Moi ici: No artigo, pela enésima vez um representante do sector apela aos apoios do estado - "e apelando ao Estado para a adoção de medidas orçamentais" - porque o sector não gera riqueza para remunerar os participantes. E o mesmo representante acha que o sector pode ser atraente para os trabalhadores]

E noção? Recordo os empresários têxteis... É verdade, não é impunemente que se diz mal

Recordar a Herdmar e A brutal realidade de uma foto.

Recordar Erik Reinert e Para reflexão de onde sublinho:

"a nation - just as a person - still cannot break such vicious circles without changing professions." [Moi ici: Talvez por isto as mais de 60 pessoas empregadas que responderam a um anúncio de emprego em Falta mão de obra? (parte II)]

Recordar The "flying geese" model, ou deixem as empresas morrer!!! onde Reinert nos conta como uma cidade de sapateiros, St. Louis, pagou os jogos olímpicos e uma feira mundial em 1904. 

sexta-feira, junho 03, 2022

Leite, a commodity

Continua a minha leitura de "The Crux - How Leaders Become Strategists" de Richard P. Rumelt. Uma das coisas que gosto em Rumelt é quando ele conta casos negativos e explica-os. Para mim é quase sempre um alívio, no dia a dia vejo tanto coisa que não compreendo, que para mim não tem sentido, que às vezes penso que o problema é meu. Rumelt repõe a minha sanidade. Por exemplo, ainda ontem foi o suposto plano estratégico do BNP.

Um desses casos é o da Dean Foods, uma empresa de produtos lácteos, o maior produtor de leite nos Estados Unidos. Quem pesquisar este blogue com a palavra leite verá que há anos escrevo sobre o tema seguindo uma lógica contrária ao mainstream.

Ler Rumelt sobre A Dean Foods resultou em:

"Dean’s constituent parts were forty to sixty small milk processors. [Moi ici: Isto faz-me lembrar a Gráfica Mirandela. Se o negócio é volume, se o negócio é eficiência, têm de ser grandes unidades de processamento de leite, não muitas pequenas] Some were mom-and-pop operations; some were larger. The processors gathered milk from dairy farmers, pasteurized it, homogenized it, and performed varying degrees of separation. ... The roll-up gave Dean Foods more than sixty different brands of milk and butter, some fairly well known and some very local [Moi ici: Sessenta marcas?!?!?!

...

Since the late 1990s, fluid milk consumption in the United States had been gradually declining, on average about 2–3 percent per year, with ups and downs along the way. 

...

Dairy farmers as a whole generally produced excess milk that was often just poured into the ground. Milk prices varied with demand, the size of the herd of cows, and the price of feed. Demand was pushed and pulled by fashions for cheese, yogurt, and protein powders.

The fundamental problem faced by Dean Foods was that it wasn’t really a national company. Competition was local.

...

About 80 percent of all fluid milk sold was private-label products with no national brand names. [Moi ici: Custo, custo, custo. As marcas não têm nada a ver com o negócio]  Having a national footprint did nothing to increase bargaining power. 

...

To deal with this set of issues, the company sought to increase its operational efficiency. [Moi ici: A solução fácil, rápida e ... errada. Prolonga a vida da empresa ligada à máquina] It closed some processing plants and adjusted supply routes. It established a system of “key performance indicators” (KPIs) that measured performance and progress weekly and monthly. The KPIs covered volume, revenue, sales discounts, expenses, elements of cost, and customer margins by district.

...

Milk prices are usually capped by surplus production. Pressing the existing system for efficiency was not going to solve these fundamental challenges.

...

Beginning in 2014, Dean Foods faced a trifecta of problems. China cut back sharply on its milk imports, and the EU lifted its milk-production quotas. Russia banned milk imports. Surplus milk was spilled into ditches in the United States even as consumer demand took a downward step. The company doubled down on its efficiency goals.

...

[Moi ici: Entretanto, em 2019 a Dean Foods pediu protecção contra os credores] What could Dean Foods have done differently? 

...

Rolling up dairy processors did not solve the problems of excess production or declining demand. [Moi ici: Como não pensar no aperto que os produtores de leite sofrem por cá porque ninguém tem coragem de dizer a verdade e olhar o assunto de frente] Nor did it magically make a national business out of forty to sixty local processors. Dean Foods’ raft of KPIs could not make fundamental improvements in a host of local patched-together businesses. Measuring something doesn’t always mean it can be improved.

Had the product been pickles or corn chips, the original roll-up might have worked. But hard-to-brand, locally processed, private-label fluid milk?” [Moi ici: Como não recordar O leite é a commodity alimentar por excelência]

sexta-feira, abril 22, 2022

Subir na escala de valor é fundamental

Ao longo dos anos que sigo o martírio do sector do leite em Portugal. Entre as dezenas de postais sobre o leite saliento, a título de exemplo:

Agora leiam este artigo sobre a Valio, uma empresa de um país com cerca de 5 milhões de habitantes, a Finlândia, "Finnish dairy company Valio is feeding the future":
"Today, Valio—with net sales of €1.8 billion (US$2 billion)—is a private company that is still owned by the 4,000 cooperative family farms that produce its milk. Led by CEO Annikka Hurme, Valio is Finland’s biggest food exporter, selling products in some 60 countries around the world.
...
Valio entered the plant-based sector in 2018, with its oat-milk brand Oddlygood. [Moi ici: Comparar com a reacção das empresas de laticinios em Portugal - E fechá-los numa sala durante 12 horas?]
...
S+B: What other trends are shaping your growth strategy? 
HURME: We’ve seen increased preference for products with less sugar and more protein. For example, we have developed lactose-free milk powders with various added ingredients that we can offer to chocolate companies. By using the powders, they can maintain the quality and taste of their chocolate, with less sugar. This is something very specific that we can do for our customers that sets us apart from competitors. Everyone can offer lactose-free; our advantage is that we can lower the sugar content. [Moi ici: Comparar com a mensagem de Subir na escala de valor, um exemplo.]"

segunda-feira, março 14, 2022

Subir na escala de valor, um exemplo


Ontem no postal "Olhar o touro de frente" escrevi acerca do futuro para as explorações leiteiras:
"Trabalha-se o numerador. Segue-se a lição de Marn e Rosiello, há que subir preços da única forma que um mercado competitivo permite, apostando em produtos de maior valor acrescentado, apostando na concorrência imperfeita. Não sei, confesso a minha ignorância, mas talvez criando experiências empresariais que desenvolvam produtos tecnológicos ou farmacêuticos à custa do leite, não necessariamente alimentares. Recordo as escamas do bacalhau islandês e as folhas das videiras."

Sim, eu sei o que costumo escrever aqui: os macacos não voam, trepam às árvores!

Entretanto, estava a preparar-me para sair para a Missa de Domingo quando deparo com este texto, "Kirin looks beyond beer with $870mn push into healthcare and pharma". Um produtor de cerveja, a braços com a quebra do consumo decorrente do Inverno demográfico e da crescente imagem negativa das bebidas alcoólicas no Japão, quer usar a techmogia e know-how sobre o processo de fermentação alcoólica em experiências biotecnológicas, para dar um novo rumo à empresa.

"Kirin will invest about ¥100bn ($870mn) in its healthcare and pharmaceutical businesses over the next three years, as the Japanese brewer pushes beyond the shrinking beer market at home and setbacks to its core businesses in Asia.

...

'If the beer segment would grow forever, it would've been better for us to focus on it, because making a challenge in a new business is very tough," he said.

...

'We want to turn Kirin into a fermentation biotechnology company. We need to grow a new business while the beer segment is still healthy," he added.

...

Kirin wants to use the technology of the beer-making process, in which sugars are converted by yeast to alcohol, in its biotech ventures."

Suspeito que uma abordagem destas, "making a challenge in a new business is very tough", nunca será seguida numa cooperativa sujeita a um processo eleitoral periódico. Uma abordagem destas é arriscada, não garante sucesso, e requer pensamento no longo prazo, disciplina e sangue frio. Uma abordagem destas requer passar poder, gradualmente, para outros "nerds", requer abertura a outro tipo de ecossistema de partes interessadas. Claro que os poderes estabelecidos reagirão, não por maldade, mas porque são humanos. Recordar:
"I'd argue that processes critically important for an organization's existence define its evolution. If something is existentially important, those providing it will have more leverage. And former strongmen become irrelevant. ...

Ergo. Economic processes aren't neutral power-wise. That's a major factor in the evolution of power structures. That would also explain why many in power would sabotage economic development. If it's too complex for them to administer, it will change the power balance, not in their favor."

 

domingo, março 13, 2022

Olhar o touro de frente

Ontem dei uma vista de olhos a um semanário e encontrei um artigo de José Martino intitulado "Agros: que futuro?".

Entretanto, hoje pensei nele e numa perspectiva que não me ocorreu inicialmente. 

Olhar o touro de frente ... sem paninhos quentes, sem subterfúgios, olhar para o contexto, olhar para os números, olhar para os factos, e comunicar com verdade. Sim, é certo que sempre haverá quem acredite no Pai Natal, sempre haverá quem esteja contra a troika e o corte de salários:


Basta assistir a uma reunião de condomínio ... Ou recordar este tweet.

Há anos que escrevo aqui sobre o leite e não sou meigo para os produtores. Operam num sector onde ganha quem tiver o preço mais baixo. O leite é a commodity por excelência no sector alimentar. (Algo que aprendi no livro "Retailization - Brand Survival in the Age of Retailer Power":."Milk is the ultimate low-involvement category, and it shows. Only 10% of the international sample (in Denmark, Germany and Spain the number is less than 5%) would expect the private label version to be of a lesser quality.")

Operar num sector como o leite implica viver no mundo da Red Queen: “Here you must run faster and faster to get nowhere at all!”

Operar num sector como o leite implica viver num mundo como o das startups que procuram crescer desalmadamente. Quantas vacas tem uma exploração-tipo em Portugal? Não tenho números recentes. 60? 80? Pensem nos custos por litro de leite numa exploração com 30 000 vacas. Pensem nesta evolução nos EUA e pensem no que se passará na Alemanha, Holanda e Bélgica.


Primeiro, alguns recortes do artigo:

"Os produtores de leite bovino estão sob stress extremo na atividade agrícola que desenvolvem, porque, se antes já tinham deficiência financeira de 8 a 10 cêntimos por litro de leite produzido, agora, a seca severa a extrema que assola Portugal acarreta menores produções de forragens, menos alimentos produzidos nas explorações agrícolas, mais, com a guerra na Ucrânia têm combustíveis, energia e fatores de produção mais caros (fertilizantes, forragens, concentrados para alimentação animal, etc.), certamente que o valor do défice será maior e terá variações semanais porque o encarecimento dos inputs para a agricultura faz-se semana a semana.

Não há dúvida de que o valor que o produtor de leite necessita para equilibrar a sua conta de exploração terá de ser pago pela indústria de laticínios, sendo maioritária a detida pelo setor cooperativo.

...

A Agros foi fundada em 1949, emprega 195 pessoas e registou em 2020 mais de 3,2 milhões de euros de lucros. 

...

[Moi ici: Pelos vistos a cooperativa Agros está em processo eleitoral. Daí este trecho que se segue] Na minha opinião, está a ser muito interessante este processo eleitoral porque há um combate no terreno dos candidatos em conquistar delegado a delegado, voto a voto, no objetivo de vencer as eleições, uma oportunidade para colocar ao serviço dos produtores de leite "os milhões de euros que estão entre o produtor e a Lactogal

A Agros compra o leite aos produtores e vende-o à Lactogal.

Vamos olhar para números da Lactogal. Vamos trabalhar com dados de 2018:
  • A Lactogal processou 820 milhões de litros de leite
  • A Lactogal teve 43 milhões de euros de lucro
Como é que pensa o típico político português? Seja socialista de direita ou socialista de esquerda só tem uma receita na cartilha: distribuir!

Vamos pegar nos 4300 milhões de cêntimos de euro de lucro da Lactogal e distribuí-los por cada um dos 820 milhões de litros de leite: se fiz bem as contas dá um aumento de 5,2 cêntimos por litro de leite. Como é que José Martino começa o seu artigo? 8 a 10 cêntimos? E agora será mais ...

Esta política distributivista já vimos que não resulta, mas vamos admitir que ia ser parcialmente aplicada. Que quantidade dos 43 milhões de euros deve ser canalizada para os produtores?

Depois de contabilizados os custos do passado as empresas determinam o lucro, mas o lucro, ou parte dele não é verdadeiramente o que a opinião popular pensa dele, o Lucro: O custo do futuro.

Em casa sem pão todos ralham e ninguém tem razão! Como se sai disto? Olhando o touro de frente, apresentando os factos e propondo alternativas racionais. Como se sai disto? Seguindo o Evangelho do Valor! Acerca do Evangelho do Valor.

O sector leiteiro preciso que os custos em que incorre alavanquem mais valor criado, ou seja, precisa de aumentar a sua produtividade:
Como se faz? 
Ainda há uma terceira alternativa para os produtores. Ver o que ao longo de mais de 10 anos tenho escrito aqui no blogue sobre as explorações inglesas que vendem leite cru, as explorações americanas que ganham mais com o agro-turismo do que com a venda de leite, as explorações francesas que entram nestes esquemas

segunda-feira, janeiro 17, 2022

Sem fugir da concorrência perfeita ...

"price taker - a firm in a perfectly competitive market that must take the prevailing market price as given"

Um mercado de commodities é um bom exemplo de um mercado onde reina a concorrência perfeita. Qual é a commodity por excelência no sector alimentar? O leite!

Portanto, isto faz-me lembrar crianças que acreditam no Pai Natal: 

Quem ganha num mercado onde reina a concorrência perfeita? Quem tem os custos unitários mais baixos e pode, por isso, ter os preços mais baixos. Onde é que isso nos leva?
Como se resolve a situação? Fugindo da concorrência perfeita, introduzindo diferenciação. Em 2019, acerca do azeite escrevi "E sem intenção, e sem querer, apareceu na minha mente a decisão de pôr de lado o azeite alentejano". Na semana passada, para meu espanto encontrei azeite da marca Pingo Doce que já ostenta de forma bem visível que é de Trás-os-Montes e embalado em Valpaços.

Contudo, fugir da concorrência perfeita exige pensar no que não é instintivo, implica apostar nas emoções, na paixão, na experiência. Claro que a malta das associações do sector do leite tem um rasto pouco interessante: Karma is a bitch!!! Ou os jogadores de bilhar amador no poder!

sexta-feira, agosto 06, 2021

Façam as malas e viajem pela Europa, aprendam a lição do canadiano

Toda a gente fala e escreve sobre aumentar a produtividade. A produtividade é um rácio que relaciona o valor do que sai de um processo produtivo face ao custo do que entra nesse mesmo processo produtivo. É, de certa forma, uma espécie de medida da capacidade de um processo produtivo em criar riqueza a partir de um certo custo de entrada.

Durante quase 100 anos fomos condicionados a pensar que aumentar a produtividade passa por aumentar a quantidade de peças, ou serviços que conseguimos vomitar por unidade de tempo. Pouca gente já atingiu que a forma mais inteligente de aumentar a produtividade passa por focar a atenção no valor do que se produz, mais do que no custo em que se incorre. O velho: "If the customer doesn't care about the price, why should you care about the cost?"

Quando eu tinha 20 anos, lembrem-se da frase de Napoleão, a típica PME trabalhava para o mercado interno e, quando pontualmente tinha um convite para exportar, fazia-o a preços mais baixos do que os praticados no mercado interno, um mercado protegido por barreiras alfandegárias. Bastava cobrirem os custos variáveis para já ganharem. Recordo esta época neste postal de 2016, ""um atestado de desconhecimento da realidade" (parte IV)".

Hoje vivemos num mundo completamente diferente. A economia portuguesa é muito aberta. Assim, os preços praticados no mercado nacional são baixos e qualquer PME exportadora, por norma, consegue preços mais altos a exportar do que a vender para o mercado interno. Os exemplos neste blogue são clássicos: preço do calçado exportado versus o preço do calçado importado; o mesmo para o mobiliário, para os têxteis, para a fruta, ...

Assim, uma das formas de aumentar a produtividade, passa por exportar, porque permite aumentar os preços do que se vende, ou seja, aumentar o numerador do rácio referido acima. É claro que o que se vende para fora não é o mesmo que se vende para o mercado interno, ou o que se vende para fora é para outro tipo de consumidor, que valoriza coisas diferentes das valorizadas pelos consumidores portugueses.

Esta semana passei os olhos pelo semanário Vida Económica e reparei em vários artigos acerca do preço do leite. 

  • José Martino em "De quem é a culpa na crise do leite?"
  • Maria Marramaque em "Preço do leite está estagnado há 20 anos"
 Entre algumas perguntas interessante que José Martino faz, também encontro perigosas sugestões de introduzir limitações à liberdade económica. Por exemplo, proibir as cadeias de supermercados de terem produção própria.

No texto de Maria Marramaque encontro um discurso estranho. Se um sector tem excesso de produção como pode querer aumentar preços? Se um sector compete de forma amadora com gigantes europeus como pode querer aumentar preços?

Esta figura ilustra bem o que se passa:

Enquanto uns estão no negócio e tratam-no como se fosse mistério, outros tratam-no como um algoritmo. Recordo os números acerca do tamanho das unidades de produção leiteira: uma vacaria com 100 vacas nunca poderá competir de igual para igual com uma vacaria com 30 mil vacas.

No texto de Maria Marramaque ainda encontro:
"O Governo, os produtores e os consumidores à indústria pedem inovação, produtos inovadores e de maior valor acrescentado, para logo a seguir tudo ser depreciado. Olhe-se por exemplo do leite de pastagem. E pergunto, será que o leite biológico vai pelo mesmo caminho? Poderá ser passada para o consumidor a percepção que o leite de pastagem/biológico têm os mesmos custos que o leite convencional?"

 Em 2008 decorei esta frase:

"Milk is the ultimate low-involvement category"

Não basta ser inovador! Consigo diferenciar-me? Pode alguém argumentar que é leite de pastagem quando não o é e não passa nada?

Mas voltemos ao ponto de partida, à produtividade.

A forma mais rápida de aumentar a produtividade é tentar apelar ao consumidor endinheirado e que dá valor ao modo de produção do leite. Lembram-se de quando a marca Portugal representava algo, antes de ser abastardada por Odemira?

O que é que o sector do leite fez a esta possibilidade?

Uma nota final, se não pertence ao clube dos produtores grandes e com connections talvez esteja na altura de repensar o negócio: Façam as malas e viagem pela Europa, aprendam a lição do canadiano, em vez de procurarem mercado para escoar os produtos, procurem mercados que valorizem algo que possam oferecer de forma distinta. Comecem pelo fim, comecem pelo outcome, não pelo output.

sexta-feira, agosto 07, 2020

Como se pode ser tão burro e cometer sempre os mesmos erros???


Os gregos antigos diziam que ter memória era um castigo dos deuses.

Por vezes, deparo-me com situações tão parvas que não percebo como ninguém, a começar pelos so-called jornalistas, aponta o dedo e revela o como o rei vai nú.

Lembram-se do leite e do karma?

A APROLEP desenvolveu uma campanha para reduzir as importações de leite, esquecendo que Portugal exportava mais leite do que aquele que importava. E mais, exportava leite a um preço mais alto do que o praticado em Portugal. Na base dessa campanha estava a identificação clara do país de origem do leite nas embalagens. A campanha teve sucesso e... as exportações de leite cairam porque os consumidores nos países importadores deixaram de escolher leite português.

São os famosos jogadores de bilhar amador que só pensam na próxima jogada e esquecem as suas consequências.

Hoje, encontro outro terrorista. No Jornal Económico de hoje aparece o artigo "Conservas querem substituir 200 milhões de importações".

Como começa o artigo?
"O setor nacional das indústrias de conserva de pescado valeu no ano passado cerca de 323 milhões de euros, dos quais cerca de 70%, 226 milhões de euros, respeitaram a exportações, num total de 43 mil toneladas. “No último ano, as exportações tanto em quantidade, como em valor, diminuíram cerca de 5%,"
O que faz a Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe? Em vez de se concentrar no aumento das exportações, resolve concentrar os seus escassos recursos no ataque às importações. Como se pode ser tão burro e cometer sempre os mesmos erros???
"No entender deste responsável, “para a indústria nacional será muito fácil substituir as importações, uma vez que não é um problema de capacidade produtiva, mas sim de estratégia comercial, dos canais de distribuição”.
Se cada português, nas suas compras, substituir dez latas de conservas importadas por dez conservas nacionais por ano, a economia portuguesa tem um incremento de 60 milhões de euros, criando inúmeros postos de trabalho.""
Porque não olham para os números? Os portugueses importam produtos baratos e exportam os produtos mais caros. Olhando para os dados de 2016, o kg de conserva importada era cerca de 73% do kg de conserva exportada.

Esta associação em vez de ajudar os seus associados a subir na escala de valor, está a querer que se enterrem com descontos para ganhar quota de mercado interno. PORRA!!!
Quando é que esta gente percebe que volume e quota de mercado não é o objectivo. O objectivo é o lucro!

terça-feira, julho 28, 2020

Leite - o negócio do preço por excelência

Há dias num outro postal escrevi:
"Algumas vezes é-me penoso visitar uma empresa. Um outsider consegue abstrair-se da espuma dos dias e, numa atitude racional, olhar para aquela azáfama e perceber que são como perús na antevéspera do Natal. E escrevo isto sem arrogância, até com algum melindre. Basta-me olhar para os produtos que fabricam, para o seu valor acrescentado, para a dependência das quantidades, quando o contexto é de encomendas mais pequenas e de salários mais altos."
Hoje, ao olhar para a primeira página do Wall Street Journal sinto que estou a ler um texto dedicado a este blogue, "Grocers Bottle Their Own Milk And Shake Up Dairy Industry.

Um texto sobre a indústria do leite nos Estados Unidos que ilustra tudo o que aqui vamos escrevendo ao longo dos anos sobre um produto comoditizado. Se os clientes não valorizam a diferenciação o que conta é o preço. E o cúmulo da race-to-the-bottom é quando os supermercados começam a montar as suas próprias fábricas. Se colocarmos as regras do jogo num quadro branco e começarmos a fazer combinações com o propósito de maximizar o lucro para os donos das pratleiras de braço dado com as benesses para os consumidores facilmente chegaremos ao que aparece neste artigo e neste blogue:
"Americans’ thirst for cheap milk—and grocers’ rush to provide it—are remaking the centuries-old dairy industry. [Moi ici: Recordar "Milk is the ultimate low-involvement category"] When supermarket shoppers reach for white gallon jugs these days, most of the time they grab a low-priced store brand. To expand those offerings, major grocery retailers, including Kroger Co., Walmart Inc. and Albertsons Cos., have built their own milk bottling plants.
Grocers’ move into the bottling business is threatening some of the biggest operators in the $40 billion U.S. milk industry, the purveyors of national brands.
Dean Foods Co., which until last year was the largest U.S. milk processor by sales, and Borden Dairy Co., another big producer, were sold this year after filing for bankruptcy in November and January. Executives of both had blamed some of their struggles on grocers’ focus on cheap milk, often used as a loss leader.
...
Adding to the industry’s pressures, milk’s luster has been slowly fading for years in an increasingly crowded beverage market. Many consumers have switched to bottled water and juice, or dairy alternatives made from almonds or oats; breakfast cereal has fallen out of favor. At the farmer level, about 3,300 dairy-cow herds disappeared in 2019, according to the U.S. Department of Agriculture, following low milk prices, tensions with export customers and processing plant closures across the
country. Wisconsin alone lost about 600 herds over the 12 months up to June 1, the cows typically either sold to another farmer or sent to slaughter.
Although overall dairy demand, factoring in products such as yogurt, butter and cheese, continues to grow, annual per capita U.S. milk consumption has dropped about 40% over four decades.
...
Bigger farms all the while, the dairy farms and milk cooperatives that supply milk to the processors were getting bigger and more professional. [Moi ici: Recordar a vacaria com mais de 33 mil vacas numa exploração] By 2017, the eight largest dairy cooperatives were marketing 54% of the country’s milk. To Walmart, buying milk directly from them, then processing and bottling the milk itself, started to look like a feasible cost-saving move. Walmart announced in March 2016 it would build a milk-processing plant of its own in Fort Wayne, Ind., to supply more than 600 Walmart and Sam’s Club stores in the eastern Midwest."

sábado, maio 02, 2020

E se o COVID- 19 matasse o que resta do século XX?

Quando escrevo sobre o século XX penso:
  • no século da produção em massa;
  • no século do eficientismo;
  • no século da competição baseada na escala;
  • no século da competição baseada na redução dos custos unitários;
  • no século da uniformização e da padronização.
"Decades of consolidation have made food systems more vulnerable, say experts. Beginning in the 1980s, the federal government allowed more agribusinesses to merge and grow largely without restraint in the name of efficiency—before, antitrust and other policies helped keep these industries decentralized and competitive. Consequently, a small number of giant, often vertically integrated, firms, produce and distribute the bulk of food in the U.S.
...
Dairy Farmers of America, for example, now controls 30 percent of all raw milk in the United States.
...
In the meat industry, roughly 50 factories process 98 percent of the nation’s beef. The same holds for pork: Following industry consolidation in the late 1980s and 1990s, the portion of U.S. hogs slaughtered in massive, million-head capacity plants rose from 38 percent to 88 percent in just two decades.
...
Larger plants also concentrate more workers in close quarters, causing some of the largest clusters of COVID-19 outbreaks among workers in the country. At least 15 massive meat-processing plants shut down this month, reducing production capacity by 20 percent for both pork and beef. Experts now predict meat consumer shortages within a month and farmers are euthanizing livestock to deal with a sudden backlog of animals.
.
If you pull out one little thing in that specialized, centralized, consolidated chain, then everything crashes,” said Mary Hendrickson, a rural sociology professor at University of Missouri. “Now we have an animal welfare catastrophe, an environmental catastrophe, a farmer catastrophe, and a worker catastrophe altogether, and we can trace a lot of this back to the pursuit of efficiency.”
Como não recordar o esquema de 2008:
Mais eficiência é mais pureza estratégica.
Mais pureza estratégica é mais risco e menos flexibilidade.
Menos flexibilidade é mais mortalidade quando o mundo muda.
"the smallest and most local food providers, such as local farms providing community supported agriculture (CSA) shares, have reacted quickly to the crisis and benefited from a spike in demand for direct food sales. These businesses are not tied to complicated purchasing contracts and often work with multiple buyers and distribution channels, including direct access to consumers.
.
“If you look at what the small farmers are doing, they’re changing on a dime to online ordering systems and delivery,” said Hendrickson. “Those organizations that have the most flexibility and latitude to change are going to be really important in the future.”
.
Finally, public food infrastructure could play a critical role in supporting mid-sized producers, responding to shocks, and serving communities cut out of consolidated supply chains."
E se o COVID- 19 matasse o que resta do século XX? E se o COVID- 19 acelerasse a chegada de Mongo?

Afinal, não tenho repetido por aqui esta frase?

"El coronavirus actúa como acelerador de cambios que ya estaban en marcha...”

Trechos retirados de "Why Are Farmers Destroying Food While Grocery Stores Are Empty?"






sábado, fevereiro 29, 2020

Uma lição para as PME portuguesas

Qualquer negócio, do maior ao mais pequeno, está representado na figura acima. Qualquer negócio só tem direito à existência se conseguir atrair e manter uma plateia com "peso" suficiente para o sustentar e impedir que caia no abismo.

Uma plateia, qualquer plateia é composta por vários tipos de intervenientes - um ecossistema. No entanto, os mais importantes, os mais "pesados", são os que pagam pela oferta, são os clientes.

Os clientes não são todos iguais. Há clientes que valorizam sobretudo o preço, há clientes que valorizam sobretudo o serviço feito à medida e há clientes que valorizam sobretudo algo inovador ou diferente.

Quando falamos de leite, aprendi há muitos anos, falamos da commodity alimentar por excelência:
"Milk is the ultimate low-involvement category, and it shows. Only 10% of the international sample (in Denmark, Germany and Spain the number is less than 5%) would expect the private label version to be of a lesser quality."
 Vender leite é um negócio de preço. Qualquer negócio de preço é um negócio de eficiência, é um negócio de volume. Recordemos Marn e Rosiello:


Se o negócio é preço o modelo rola à base disto:


Neste postal recente, "O que mais ninguém lhe conta (parte II)" contei o caso de uma vacaria em Portugal com cerca de mil vacas, quando o tamanho médio das vacarias rondava há uns anos as 30 vacas. Na parte I desse postal perguntava:
Como é que num negócio em que o que conta é o preço (logo o custo), uma exploração com 30 vacas, ou 50 vacas, pode competir com uma de 500 ou de 900 vacas? (900 é só o número médio)?
Na parte I desse postal admirava-me com um vacaria americana com 9 mil vacas. Neste postal de 2012, "A verdade que não nos é contada, acerca do leite" citei uma breve referência a uma vacaria que teria 30 mil vacas:
"One farm in Indiana has 30,000 cows, and is a tourist attraction, with its own off-ramp on the interstate."
 Como é que num negócio em que o que conta é o preço (logo o custo), uma exploração com 900 vacas, pode competir com uma de 30 mil vacas?

Se optarem pela concorrência perfeita não podem ponto! Por isso, metem os políticos ao barulho e nasce o pernicioso activismo político associado ao leite.

Se o negócio é preço não há mistério, como diria Roger Martin. Se o negócio é preço não há arte, há ciência, há algoritmo:
Se o negócio é preço a abordagem a seguir é a do pragmatismo que me surpreendeu na altura. As formigas no piquenique em, "Faz sentido continuar a apostar num negócio?" (Julho de 2006).
Daí não ser de espantar esta evolução:
"Em 25 anos (entre 1989 e 2013) desapareceram 90 mil explorações e reduziu-se o efetivo animal em mais de 140 mil vacas leiteiras, o que corresponde a variações negativas de, respetivamente, 92,2% e 34,7%.
Esta evolução traduziu-se sobretudo na eliminação de explorações pecuárias com um número reduzido de efetivos e consequente aumento da dimensão média dos efetivos por exploração (de cerca de 4 vacas por exploração para aproximadamente 34 vacas por exploração)."
Ontem à noite, ao folhear a Bloomberg Businessweek do próximo dia 2 de Março comecei por apanhar uma foto que me fez recordar a tal vacaria portuguesa com cerca de 1000 vacas:


Em "The Dairy Farm of Your Imagination Is Disappearing" encontrei a tal vacaria com 30 mil vacas que referi no postal de 2012 citado acima:
"This is Fair Oaks Farms, an Indiana tourist attraction designed to entertain road-weary families and deliver them back to the highway reassured that American agriculture is headed in the right direction. With more than 33,000 cows that pump out some 300,000 gallons of milk daily, it’s also quite a bit more.
...
In Wisconsin alone, between two and three family dairy farms go out of business every single day. (Some of these farms still operate, but no longer as dairies.) That rate has held steady for about three years, which is particularly striking given how few farms remain left to fail. In the early 1970s, the state had more than 75,000 dairies. Today it has about 7,400.
...
Half of Minnesota’s dairy farmers failed to break even for the year. There, too, thousands of dairy farms have simply vanished.
.
In the midst of this mass extinction, a counterintuitive fact remains true: Americans are consuming more dairy products than ever before, primarily because yogurt and cheese have compensated for a steady drop in fluid milk consumption. Americans consumed 646 pounds of dairy per person in 2018—the highest consumption rate in 56 years.
...
As small farms fold, the balance of production tilts further toward huge, efficient, industrial dairy operations that can more easily weather price downturns and manage a razor-thin profit margin through the power of scale.
...
“Thirty years ago, when I got started, if you would have asked me what a large farm was, I probably would have said 15 or 20 cows, [Moi ici: Conseguem imaginar a vertigem da evolução durante estes 30 anos?]
[Moi ici: Comparar com Portugal]
...
Today, more than 53% of America’s milk is produced by less than 3% of its farms. That helps explain how, in the face of a massive reduction in the number of total dairies, the U.S. continues to produce more milk and cheese than the market consumes—in 2019, America’s cheese surplus reached 1.4 billion pounds.
...
“Now, what we see, obviously, is economies of scale having happened in America—big get bigger, and small go out,” Perdue said. “I don’t think in America we, for any small business, have a guaranteed income or a guaranteed probability of survival.” Maybe he was just stating a hard truth, but to a farmer like Yager, it sounded as if the architects of the U.S. dairy industry had all but agreed on a shared assumption: Small farms are destined, sooner or later, to fail.
...
Every time you come up with a plan to maybe make things better, I just feel like there’s someone who’s already a step ahead of you,” Yager says. “So what do you do?” [Moi ici: Competir no negócio do preço é estar sujeito ao efeito da Rainha Vermelha. Correr, correr, correr desalmadamente para conseguir ficar no mesmo sítio]
.
A lot of people go out of business.
...
There’s got to be something other than saying, ‘Well, you have to be big to survive,’ ” he says. [Moi ici: Reacção típica de quem apenas conhece uma alternativa e julga que todos os clientes são iguais e valorizam as mesmas coisas. Recordo dois exemplos franceses aqui e aqui. Recordo um exemplo inglês com leite biológico completo e a aposta na diferenciação] “Maybe this is getting a little radical, but it reminds me of medieval times. Like we’re going back to that. We’ll have our kings—the owners, the corporations—and then we’ll have all the people who work the land. That didn’t work well centuries ago. Because taking ownership, taking pride—that’s what makes things really work. We’re gonna lose that. And think about conservation. Think about water quality. I don’t think you find land conservation, water quality, and animal care any better, anywhere in the world, than you do on these family farms. You absolutely will not!
...
Amid all that angst, some farmers have found a way to profit on smallness itself.[Moi ici: Malta do calçado, estão a ver o exemplo?]
.
Paul Aubertine grew up on a plot of land overlooking the St. Lawrence River on the northern edge of New York state, near Cape Vincent. He was poised to be the seventh generation of his family to take the reins of the 50-cow dairy farm, but in 2002 his father and grandfather determined they couldn’t keep the business afloat any longer. Aubertine went to college, pursued a career in sales, and started a family.
.
The older he got, the more he recognized and valued all that had been lost. There’d been 35 or 40 dairies in the community when he was growing up; now, wracking his brain, he could come up with four. “I really wanted my kids to experience what I’d experienced, to give them the chance to grow up on a farm and be exposed to the same thing,” he says.
.
He and his brother-in-law, a computer scientist, decided in 2015 to restart the dairy. They crunched the numbers and saw that trying to compete with the 1,000-cow mega-dairies on their terms was a recipe for disaster. “I’ve never had an interest in having employees, and $300,000 tractors, and all the other stuff you need for that,” says Aubertine, who’s now 37. Instead, they decided to produce milk that could be certified as grass-fed and organic. Their cows would graze in the field. Aubertine would buy no herbicides, no grain feed, no nutritional supplements, no hormone treatments. Instead of acquiring the huge, high-powered heifers that produce 90 pounds of milk a day, he assembled a herd of smaller cows that might give him 35. Because of the animals’ reduced stress, he could keep them on the farm longer, saving on livestock costs.
.
“I’m a realist, and I expected bumps on the road, but—and I shouldn’t say this out loud, probably—but it’s been beyond my expectations, what we’ve been able to do,” Aubertine says. The price he commands for grass-fed organic milk isn’t double that of regular milk, but it’s close, and his expenses are a fraction of what a modern dairy would require. He can raise his kids, take them on vacations, buy nice things, and preserve precisely the things about dairy farming that he believed were worth preserving."





quinta-feira, fevereiro 20, 2020

O que mais ninguém lhe conta (parte II)

Parte I.

Num relatório de 2007, (infelizmente não encontro nada mais recente), intitulado "Leite e Lacticínios - Diagnóstico Sectorial, elaborado por Gabinete de Planeamento e Políticas, descobri esta figura:
Estão a imaginar o que é competir pelo preço e ter menos de 9 vacas enquanto que outros têm mais de 60?

Quando mostrei este gráfico, mostraram-me fotos de uma vacaria portuguesa com cerca de ... mil vacas.

domingo, fevereiro 16, 2020

O que mais ninguém lhe conta

Na AppleMagazine de 7 de Fevereiro último encontrei este trecho:
"At Rosendale Dairy, each of the 9,000 cows has a microchip implanted in an ear that workers can scan with smartphones for up-to-the-minute information on how the animal is doing —everything from their nutrition to their health history to their productivity. Feed is calibrated to deliver a precise diet and machines handle the milking. In the fields, drones gather data that helps bump up yields for the row crops grown to feed the animals.
.
Technology has played an important role in agriculture for years but it’s become a life and death matter at dairy farms these days, as low milk prices have ratcheted up pressure on farmers to seek every possible efficiency to avoid joining the thousands of operations that have failed."
9 mil vacas...

E recordei estes números:
"Em 2011, num postal, publiquei estes números:
"Terceiro: Quantas vacas existem em média numa exploração leiteira
Na Roménia? 1,5
Em Portugal? 18 (em 2010); 10 (em 1995)
Em Espanha? 42 (em 1995)
Em França? 60 (em 1995)
Na Alemanha? 55 (em 1995)
Na Dinamarca? 69 (em 1995)
No estado do Wisconsin? 98 (em 2010)"
 Apesar de tudo, foi com algum espanto que na quinta-feira à noite, via @nticomuna cheguei a este número "Over half of US dairy herds now milk over 900 cows"
Como é que num negócio em que o que conta é o preço (logo o custo), uma exploração com 30 vacas, ou 50 vacas, pode competir com uma de 500 ou de 900 vacas? (900 é só o número médio)
.
Não pode! Daí nasce o apelo ao activismo político, ao proteccionismo, ao barulho da rua. É assim que a distribuição grande pode, ao longo dos anos, comprar cada vez mais barato. Uma parte dos produtores cresce muito depressa e torna-se muito mais competitivo que os outros e aceita, ou até propõe, preços mais baixos para ganhar quota de mercado.

quarta-feira, janeiro 29, 2020

Fugir da race-to-the-bottom


O amigo @walternatez chamou-me a atenção para este artigo muito interessante:

Há uma frase acerca do leite que já citei aqui muitas vezes:
"Milk is the ultimate low-involvement category, and it shows. Only 10% of the international sample (in Denmark, Germany and Spain the number is less than 5%) would expect the private label version to be of a lesser quality."
Cito-a, embora não a pratique. Há muitos anos que prefiro leite dos Açores.

Outra citação deste blogue é:
"When something is commoditized, an adjacent market becomes valuable"
Como fugir à comoditização? Apostando na diferenciação. Recordo este exemplo francês do leite integral que descrevi no ano passado em "Cambão versus estratégias baseadas nos clientes-alvo".

O artigo conta uma estória sobre como fugir da race-to-the-bottom:
"“Someone said, would I please have a look at milk,” Chabanne said. “So I did. It was an
absolute disaster. Dairy farmers were desperate, losing money on every litre; prices werebeing driven down mercilessly by the big retail groups.”
Chabanne did the arithmetic: a mere eight cents (6.8p) a litre was the difference between
a milk producer going bust (or worse: the suicide rate among French dairy farmers is30% higher than in the general population) and making a decent living. [Moi ici: A distribuição grande consegue este poder negocial porque há produtores muito grandes que conseguem ganhar dinheiro mesmo com preços muito baixos. Recordo o tamanho médio das produções leiteiras em Portugal e na Europa. No texto sobre Portugal escrevi "Explorações com menos de 10 cabeças podem ser rentáveis, não podem é seguir o mesmo modelo de negócio das que praticam a produção à escala industrial."]
...
“The average French consumer buys 50 litres of milk a year,” he said. “That meant that if consumers spent just €4 more on their milk per year, the producer might actually survive. I was convinced people would be prepared to do that.”
.
His hunch has proved right. French consumers have bought 123m litres of milk labelled C’est qui le patron?! (Who’s the boss?) since its launch in November 2016, making it the fourth-biggest milk brand in France, outsold only by the most cut-price supermarket-own brands. [Moi ici: Como não recordar o tema da polarização dos mercados]
...
As with all of the cooperative’s products, neither was advertised on TV, promoted instore or pushed by a sales team. [Moi ici: Notável]
...
The basic assumption by supermarkets is that all consumers want competitively priced produce. The cheaper, the better. CQLP might have just rewritten that rule. [Moi ici: Como não recordar a ideia de que quem trabalha prefere trabalhar para uma empresa que dê sentido ao seu esforço. Como não recordar que na língua inglesa "patron", patrono, é também sinónimo de cliente regular. Aquele que patroniza]
...
In just three years, CQLP has won over nearly 11.5 million French consumers – about one in five adults. It has also boosted the incomes of more than 3,000 farmers and manufacturers, all of whom benefit from the pledge emblazoned in big, bold capitals on the brand’s packaging: “This product pays its producer a fair price.”
...
C’est qui le patron?! is “basically about consumers both taking control of what’s on our plates, and supporting producers”, he said. “There will always be people, for all kinds of reasons, for whom price matters most. But there are also more and more who feel maybe slightly guilty when they shop for food – and would like to do better.”"
Lembrei-me da estória dos pêssegos:
"A informação que o gerente me deu não devia estar escondida. A caixa de pêssegos devia ter uma foto do agricultor, um mapa da região onde foram produzidos e uma mensagem pessoal dele para os consumidores.
.
Voltando ao segundo tweet, citado lá em cima, o século XX enterrou-nos no Normalistão, encarcerou-nos num modelo mental em que só o preço conta, e só nos ensinou uma forma de fazer preços: custo mais uma margem.
.
No Estranhistão, os actores económicos vão aprender que o preço não tem nada a ver com o custo e tudo a ver com o valor percepcionado pelos clientes-alvo."

quinta-feira, novembro 14, 2019

A guerra do leite

No WSJ de ontem, "Milk Leader Files for Bankruptcy":
"Dean Foods Co., the biggest U.S. milk company, filed for bankruptcy protection, a fresh setback to a U.S. dairy industry struggling against declining U.S. milk consumption and rising competition.
Dean and dairy farmers for years have grappled with consumers’ decadeslong move away from traditional cow’s milk, as beverage sales shift toward bottled water, fruit juices and milk alternatives made from soy and oats."
Interessante perceber que naquela que é a commodity alimentar por excelência, o leite, a maior empresa de leite não aguentou a luta no mercado. Claro que se pode ser o maior como resultado de um somatório de muitos pequenos, mas isso não é competitivo com os que têm unidades muito grandes:
"Dean operates about 60 dairy processing plants in 29 states, a network it built through years of acquiring regional dairy companies to become the top U.S. milk processor by volume."
É como as empresas grandes que querem ter as suas máquinas sempre a trabalhar nem que seja a produzir encomendas grandes e pequenas. Empresa grande tem de ter encomendas grandes, recordar a Mirandela e a sua loucura. Assim, ser o maior produtor num negócio de preço não serviu de nada quando o colume está distribuído por 60 unidades e não por 15.

BTW, recordo "E fechá-los numa sala durante 12 horas?" com:
"Sales of traditional cow's milk have declined, while consumers spend more on other beverages, such as soy-and almond-based milk alternatives."
 Agora imaginem o impacte desta evolução na Europa, cheia de governos activistas sempre preparados para torrar dinheiro dos contribuintes a defender um paradigma enganador. O dinheiro não vai para os agricultores, o dinheiro vai para os DDT.

quarta-feira, outubro 23, 2019

Mudar de proposta de valor, mudar de job-to-be-done.

Ao ler "2 Supplements That Double Weight Loss":
"One study has shown that people drinking more milk, which contains vitamin D and calcium, can double weight loss."
Pensei logo numa proposta de valor para a malta do leite deste postal "E fechá-los numa sala durante 12 horas?".

Mudar de proposta de valor, mudar de job-to-be-done.

quinta-feira, setembro 19, 2019

"The Great Sparrow Campaign" - gente perigosa (parte II) ou Heterogeneidade dos mercados (parte III)

Esta manhã ao ler um artigo delicioso, aborda o tema da estratégia sobre uma perspectiva psicológica que nunca tinha lido, a certa altura escrevi na borda do texto digital: (cromos, galeria, Zapatero, cemitérios).

Agora acrescento "realidade aumentada" segundo esta abordagem em "Para assentar ideias". Neste texto escrevo que, tal como no artigo que ando a ler, a realidade existe, mas nós não somos capazes de ver a realidade, nós só somos capazes de ver aquilo que a nossa experiência nos preparou para ver. Por isso, quando o mundo muda, é fundamental ter gente sem mapas cognitivos castrados em posições de poder, para não estarem demasiado prisioneiros do passado. Por isso, escrevi que o melhor era Zapatero sair. Por isso, coleccionei a galeria de cromos, gente formatada numa época e incapaz de partir o molde onde foi educada. Como não recordar Napoleão:
Por isso, apontei "cemitérios" por causa de uma frase de Max Planck: "Uma nova verdade científica não triunfa convencendo seus oponentes e fazendo-os ver a luz, mas porque seus oponentes finalmente morrem e uma nova geração  que está familiarizada com ela cresce".

Em Portugal, com as mesmas caras há décadas nos cargos de poder parece que continuamos sempre a combater os desafios de hoje com a mentalidade que formatou essa mesma gente no tempo em que não havia nem internet, nem União Europeia.

Em ""The Great Sparrow Campaign" - gente perigosa" escrevi mais uma vez sobre os jogadores amadores de bilhar, um tipo de gente muito perigoso. Gente que Reich apelidaría de Zé-Ninguém, só capaz de ter um horizonte temporal entre o que almoçou e o que vai jantar.

Em Março e Dezembro de 2016 escrevia aqui que havia uns aprendizes de feiticeiro à frente da APROLEP. essa gente queria acabar com as importações de leite, esquecendo que Portugal exportava mais leite do que aquele que importava. Claro, em 2018 a brincadeira rebentou-lhes na mão, a medida que defendiam em 2016 para impedir as importações de leite, arrasou as importações de leite em Espanha, leite que era exportado por ... Portugal.

Esta semana li um texto que me fez lembrar os aprendizes de feiticeiro à frente da APROLEP, desta feita acerca das importações de carne... here we go again, "Defender a Agricultura, defender Portugal":
"A agricultura é a arte de produzir alimentos para a sociedade, [Moi ici: Estou farto de escrever aqui no blogue que a função do agricultor não é alimentar a sociedade, a função do agricultor é ganhar dinheiro através da prática da agricultura. A sociedade não quer saber dos agricultores, quer produtos agrícolas baratos nem que venham da Ucrânia. Por isso, o agricultor não deve ser trouxa e deve trabalhar para quem valoriza o fruto da sua actividade. Adiante] ocupando o território e fixando pessoas, que, através da sua actividade agrícola, mantêm os territórios limpos e ordenados, contribuindo para a manutenção da fauna e flora autóctones. [Moi ici: Sim, a começar pelos eucaliptos, não é?]
...
Portugal é deficitário em carne, e nesse sentido deve apostar em equilibrar a sua balança comercial através do aumento da sua produção nacional.[Moi ici: Cuidado com a estratégia cancerosa, que destrói a joalharia]
...
É com este tipo de medidas que iremos conseguir reduzir a nossa pegada carbónica, ao contrário do que nos tentam vender dizendo que a carne importada até é mais barata… e onde os custos ambientais já não são tidos em conta, como é o exemplo do recente acordo da UE com o Mercosul. A Fenapecuária é literalmente contra este acordo, considera mesmo que é um acordo desleal para com o sector e solicita a todos os partidos políticos que reflictam bem sobre o que está em causa.[Moi ici: Gente ao nível de um Nuno Melo e do seu grito contra os paquistaneses. A um produtor de carne eu aconselharia a subir na escala de valor, a fugir da concorrência pela quantidade e preço e que apostasse na joalharia]
.
Os portugueses merecem saber que as condições e regras de produção não são as mesmas, os portugueses merecem saber que o sector pecuário nacional é moderno, respeita as regras ambientais, cumpre com o bem-estar animal,"[Moi ici: Indo por este caminho, alimentamos o discurso que legitima alguém na Alemanha, ou em França, dizer que a carne portuguesa é produzida em condições e regras de produção que não são as mesmas. O karma é lixado!]"